[CÂNCER DE PRÓSTATA] Paulo Gomide

Paulo Gomide tem 62 anos, é economista, aposentado. Atualmente trabalha como chefe de gabinete da prefeitura na cidade Miguel Pereira, interior do Rio de Janeiro. Trabalha porque precisa e por que gosta muito. É casado, pela segunda vez e tem dois filhos do primeiro casamento. 
Paulo, esta entrevista tem como objetivo conhecer um pouco sobre você e sobre a sua doença. Começaremos lá da fase inicial, onde você recebeu o diagnóstico da sua doença e chegaremos até os dias de hoje... Pode ser? 
 
Instituto Oncoguia - Vamos começar pelo seu diagnóstico?

Paulo Gomide - Sim, pode ser. Mas antes preciso te contar uma parte da minha vida, antes do câncer de próstata. Em 92 eu tive um tumor de bexiga, na época fiz cirurgia e aplicação de BCG. Durante quase 10 anos da minha vida fiquei envolvido com este assunto e isso foi um dos maiores problemas da minha vida, pois fui vítima de negligência médica. Fiz até quimioterapia sem necessidade. Foi numa tentativa de cistoscopia que o médico que me acompanhava sugeriu que eu podia ter problemas de próstata, pois ele não conseguiu fazer o exame. Ele era o médico que cuidava de mim, o meu urologista, e ele nunca havia me pedido um PSA ou feito exame de toque. Nunca! E eu achando que ele estava cuidando de mim! Até que acabamos brigando por conta de problemas com convênio e por causa das grosserias dele e eu fui procurar outro médico. Foi com esse novo médico que eu fiquei sabendo que estava com câncer de próstata. Isso foi em 2003. 
 
Instituto Oncoguia - E como foi receber o diagnóstico de câncer de próstata?

Paulo Gomide - Bom, foi como levar um soco no estômago... o médico me disse que era câncer, que era inoperável (grau 9) e que era muito grave. Como é que você fica ao ouvir isso? Eu estava sozinho na hora. O médico me indicou 2 oncologistas, segundo ele, um mais conservador e outro, mais radical. Bom, sai da consulta e liguei para meu filho. Foi a primeira pessoa com quem conversei. Eu tava mal... Ainda liguei para dois amigos donos de clínicas radiológicas para conversar e agendar os exames. Eu ia ter que fazer todos os exames para decidir qual seria o próximo passo. Cheguei em casa e contei para a Tânia. Ela é maravilhosa! (se emociona) Eu sou um cara de muita sorte. Tenho uma mulher como ela... Nessa hora eu chorei, desabafei... Acho que não merecia. Bom, nos próximos dias, lá fui eu conversar com os dois oncologistas indicados. O mais conservador me disse que não dava mesmo para operar, que o tratamento era hormonal e que eu ia perder toda a minha libido. Achei-o um pouco insensível, grosso. Perguntei qual era o meu prognóstico e ele disse que era de 6 a 12 anos. Bom, ainda tenho uns nove, né Luciana? O radical sugeriu a operação e rever todos os meus exames. Lembro que este médico, eu até chorei... tava muito difícil. Acabei ficando com o Carlinhos (o oncologista Carlos José Coelho), o que indicou o Dr. Henrique, com quem eu fiz a cirurgia. Com o Henrique tive uma grande empatia e isso é fundamental. A gente precisa se sentir bem com o médico da gente, perguntar todas as dúvidas, confiar. Depois de refazer todos os exames e do meu médico me dizer que dava sim para operar, marcamos a cirurgia, a forma de eu ficar curado. 
 
Instituto Oncoguia - Você procurou informações na internet? Foi útil? De que forma?

Paulo Gomide - Procurei tudo que pude. Li tudo sobre ca de próstata, tratamentos, novidades, casos clínicos... O que encontrei eu li. Mas, acho que não aconselho que as pessoas façam isso, nem sempre as informações são úteis, e a gente acaba ficando com um monte de informações que não servem pra nada. 
 
Instituto Oncoguia - Procurou alguém para conversar, desabafar?

Paulo Gomide - Sim, na época falei com um psicólogo e foi muito bom. Lembro de ele me falar que eu era um cara guerreiro. 
 
Instituto Oncoguia - Qual foi o tratamento? Cirurgia e medicamento?

Paulo Gomide - Bom, a cirurgia ocorreu no dia 03 de dezembro de 2003, apesar de algumas intercorrências com a Amil, tudo correu bem. Combinamos que faríamos o meu PSA depois de 60 dias. Assim foi e o resultado deu 2,44. E a opção para que ele abaixasse era entrar com o Zoladex. Nós conversamos sobre o tratamento e sobre os efeitos que poderiam acontecer. Falamos do que poderia acontecer com a libido. Olha, acontece mesmo, zera. Você não sente nenhuma vontade. E olha que eu tinha uma vida bem ativa pra minha idade.

Instituto Oncoguia - O que me fez aceitar o tratamento?
 
Paulo Gomide - Ficar vivo, saber que este remédio me ajudaria a controlar a doença, isso é o mais importante. Tomei o zoladex por mais de um ano, mais ou menos e resolvermos dar um tempo. 
 
Instituto Oncoguia - Você apresentou algum efeito colateral? Se sim, como fez para diminuí-lo?

Paulo Gomide - Sim, as ondas de calor, a queda da libido, osteoporose, queda de todos os pelos do corpo (isso ninguém tinha falado) e aumento das mamas. Isso, eu até esqueci de falar para o meu médico, to falando pra você. A libido é realmente complicada... eu já tinha a questão da impotência depois da cirurgia, então ficava bem difícil. Mas, o que faço é tentar viver o melhor que eu posso e vou fazendo o que dá para fazer. 
 
Instituto Oncoguia - Antes de iniciar o tratamento, o que você esperava do remédio?

Paulo Gomide - Esperava que realmente me ajudasse a controlar o câncer. E foi isso mesmo que aconteceu, pois enquanto eu fiquei tomando, o meu PSA ficou 00000. Então foi muito bom! Parei de tomar em 2005 e estou sem até agora. Em setembro, o meu Psa estava em 0, 27 e em novembro 0,42. Ele ta subindo, por isso resolvemos fazer o exame a cada dois meses. Passo um mês e meio na expectativa pelo resultado, a gente fica ansioso. O que eu mais gostaria é que estacionasse no 1 e pouco, mas... 
 
Instituto Oncoguia - E do seu médico, o que você espera que ele considere quando faz a prescrição de um tratamento?

Paulo Gomide - Espero que ele pense em controlar a minha doença mantendo a qualidade da minha vida. 
 
Instituto Oncoguia - E se tiver que voltar a tomar?

Paulo Gomide - Eu não gostaria de voltar a tomar, mas é claro que se precisar, eu volto. 
 
Instituto Oncoguia - Por que não gostaria?

Paulo Gomide - Ah, por que significa que a doença está ativa e isso eu não queria. Em segundo lugar, por causa da libido. Tenho também uma dúvida: será que o zoladex tem o mesmo efeito numa segunda tomada? Será que é diferente da primeira? Será que o meu corpo cria alguma barreira, se acostuma e ele não age tão bem quanto antes? Você sabe responder isso Luciana?
Instituto Oncoguia - Você já perguntou para o seu médico?

Paulo Gomide - Não, mas vou perguntar. 
 
Instituto Oncoguia - A libido voltou ao normal depois que você parou de tomar?

Paulo Gomide - Sim, uns dois meses depois. Hoje, eu tenho uma vida sexual menos ativa, toda vez que vou fazer sexo tenho que tomar a injeção e isso não é nada fácil. Mas é o único jeito, até já fui ver a prótese, mas acho que não precisa. 
 
Instituto Oncoguia - A relação com seus familiares se alterou de alguma forma? Com a sua esposa? Com seus filhos? No trabalho? Com amigos?

Paulo Gomide - Não mudou em nada! Minha mulher está comigo e somos muito felizes. Com meus filhos também. Não saí contando para todo mundo, mas nunca escondi que estava com o câncer. Também não fiquei nem fico me fazendo de vítima, de coitadinho. Tem gente que se aproveita da situação. Com a minha esposa tive que conversar sobre a questão do sexo e a gente vai levando. 
 
Instituto Oncoguia - Antes e depois do câncer, o que mudou na sua vida?

Paulo Gomide - Ah, eu mudei. Não tenho medo das coisas, você passa a reavaliar seus sonhos e projetos. Passa a ser mais pé no chão mais objetivo. Procuro viver o meu dia-a-dia, pois o futuro ...
 
Você consegue me dar exemplos de coisas que melhoraram e de coisas que pioraram?

Você fica mais direto, sei que to marcado e isso te dá uma outra noção do que é a vida. A morte te dá a certeza da vida. 
 
Instituto Oncoguia - E coisas que pioraram?

Paulo Gomide - O lado sexual ... (e ri) 
 
Instituto Oncoguia - De zero a dez, dê uma nota para a sua vida hoje.

Paulo Gomide - Olha que eu gostaria de dar 10, mas é 8. A falta de grana altera bastante as coisas. 
 
Instituto Oncoguia - Qual a sua maior dificuldade hoje?

Paulo Gomide - Eu acho que é a mesma que todo mundo, a falta de grana. Quero ter mais dinheiro. 
 
Instituto Oncoguia - Você lembra do câncer no seu dia-a-dia?

Paulo Gomide - Não. O que sei é que estamos falando e lidando com uma doença traiçoeira e de comportamento difícil. Mas, não procuro pensar muito nisso não. Sei o que eu não quero: eu não quero ter dor, nem degradação física. E olha, eu odiaria ter diabetes, eu adoro comer doces! 
 
Instituto Oncoguia - Se fosse lhe dada à oportunidade de viver tudo de novo a partir do diagnóstico do câncer, o que você mudaria?

Paulo Gomide - Nada, acho que somente a parte inicial do tumor da bexiga, pois foi muito frustrante. 
 
Instituto Oncoguia - Para as pessoas que estão recebendo o diagnóstico de câncer de próstata hoje, que conselho, que recado você mandaria?

Paulo Gomide - Olha, diante do diagnóstico a gente perde mesmo o chão, fica meio atordoado, perdido. Mas passa e você não pode ficar parado. Penso no câncer como uma doença crônica, que tem recursos e quero acreditar nisso. Acredito que vou morrer de infarto, de avião (ri), não do ca de próstata. As coisas dependem muito da forma como a gente enfrenta. Eu tenho algumas vantagens: a minha mulher maravilhosa e meus filhos e amigos. Eles foram e estão sendo fantásticos.

Alguns conselhos:
  • Não se desesperar.
  • Enfrentar, afinal, existem recursos.
  • Não é a pior coisa que existe.
  • Sorte.
  • Ter um bom médico.
  • Reclamar: por a revolta pra fora.
  • Não dar mole pra doença, lutar com coragem.
  • Não se iludir.

Outra coisa que eu percebo que é bem bacana é você conversar com quem ta passando por isso, poder ajudar. Tenho uma pessoa próxima passando por isso e já dei várias dicas. Você aprende no seu dia-a-dia sozinho, ninguém te ensina não. 
 
Instituto Oncoguia - O que é qualidade de vida para você?

Paulo Gomide - É na medida do possível, você conseguir manter suas funções vitais e principais sentidos. Conseguir andar, comer, não ter limitações físicas, poder ficar e se divertir com a minha família e com meus amigos.

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