Detecção precoce do câncer de mama reduz custos, mas esbarra em desinformação

Embora os números de casos de câncer de mama no Brasil sejam preocupantes, com cerca de 66.280 novos casos estimados para 2024, segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), um fator agrava ainda mais essa situação: o diagnóstico tardio. De acordo com a Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM), aproximadamente 60% dos casos são diagnosticados em estágios avançados, o que dificulta o tratamento e reduz as chances de cura. Esse cenário é desafiador, pois a detecção precoce é fundamental para aumentar as chances de cura e reduzir os custos com tratamentos complexos.

Um estudo da Sandbox Data for Health, empresa especializada em dados e estatísticas de saúde, revela que a importância do diagnóstico precoce do câncer de mama vai além dos benefícios à saúde das pacientes.

Analisando mais de 8.650 casos ao longo de cinco anos, o levantamento aponta que, quando o câncer de mama é detectado nos estágios iniciais, os custos do tratamento são significativamente menores. Os procedimentos menos invasivos, como a quadrantectomia (cirurgia apenas na região do tumor), utilizados em diagnósticos precoces, apresentam um custo médio de R$ 7.783,70. Em contrapartida, a mastectomia, indicada para casos mais avançados, teve um custo médio de R$ 13.408,80 no mesmo período.

Alexandre Vieira, diretor médico e científico da Sandbox, ressalta que esses valores aumentam consideravelmente quando tratamentos complementares são necessários. “Além do procedimento cirúrgico, o câncer de mama em estágios avançados costuma exigir quimioterapia, radioterapia e outros tratamentos que elevam ainda mais os custos para o sistema de saúde”, explica.

Além disso, a pesquisa aponta disparidades regionais no Brasil. Enquanto o tempo médio de internação para uma mastectomia em São Paulo é de 1,35 dias, no Tocantins essa média sobe para 2,33 dias, evidenciando desigualdades no acesso e tratamento da doença em diferentes regiões do país.

Desinformação sobre subtipos da doença

Uma pesquisa recente do Datafolha, encomendada pela biofarmacêutica AstraZeneca, revela que 56% das mulheres brasileiras diagnosticadas com câncer de mama não conhecem o subtipo da doença que possuem. Essa falta de informação é alarmante, pois, segundo Maira Caleffi, médica mastologista e presidente fundadora da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama), “uma vez confirmado o diagnóstico, é imprescindível conhecer o subtipo da doença, o que possibilitará personalizar o tratamento”.

Os subtipos do câncer de mama incluem luminal (hormônio positivo), HER-2 positivo e triplo-negativo. Conhecer o subtipo é crucial para que as pacientes possam entender melhor suas opções de tratamento e os riscos associados a cada um deles.

Entre as pacientes que têm conhecimento sobre seu subtipo, 70% buscam informações adicionais, destacando que os médicos (45%) e o Google (33%) são as fontes mais citadas. Apenas 16% delas tenham relatado ter realizado testes genéticos, uma ferramenta que poderia guiar decisões de tratamento e oferecer opções mais precisas para cada caso.

“Tais informações costumam servir como alerta de prevenção da família no caso de constatadas mutações herdadas”, completa Maira.

Relato pessoal

Fabiana, 41 anos e paciente da rede pública de saúde, o SUS, compartilha sua trajetória marcada pelo câncer de mama. Diagnosticada com câncer triplo-negativo aos 23 anos, ela enfrentou desafios significativos, incluindo a dificuldade em obter um diagnóstico adequado.

“O mais difícil é saber que, se o teste genético fosse acessível pelo SUS, talvez minha mãe e minha irmã pudessem ter feito cirurgias preventivase evitado esses diagnósticos”, lamenta Fabiana. Sua mãe também foi diagnosticada com câncer de mama triplo-negativo, passando por mastectomia e tratamento quimioterápico, e sua irmã, diagnosticada mais tarde, teve que retirar as duas mamas.

Após o diagnóstico inicial, Fabiana passou por quimioterapia e mastectomia radical. Recentemente, descobriu que tem mutações no gene BRCA1, fator que abre portas para novos tumores e que a levou a considerar cirurgias preventivas.

“Descobrir o gene me deu algo novo: a chance de escolher. Antes, o tratamento era urgente, mas com a cirurgia preventiva dos ovários, pude decidir de forma mais consciente. Isso me deu mais controle e, melhor ainda, ofereceu à minha família a mesma oportunidade de escolha no futuro para prevenir e cuidar da saúde”, afirma.

Conhecimento é um direito

Uma pesquisa realizada pelo Instituto Natura, em parceria com a Somatório Inteligência, revela que 31% das brasileiras acima de 18 anos são consideradas desinformadas sobre o câncer de mama. O nível de desconhecimento está diretamente relacionado a fatores como escolaridade, raça, renda e sistema de saúde. Enquanto 49% das mulheres sem escolaridade têm pouco conhecimento sobre a saúde das mamas, esse índice cai para 15% entre aquelas com ensino superior completo.

Além disso, 25% das usuárias do SUS possuem informações adequadas sobre a doença, em contraste com 38% das usuárias do sistema privado. Daniela Grelin, diretora executiva de Direitos e Saúde das Mulheres e Comunicação Institucional do Instituto Natura, enfatiza que “as desigualdades resultam na carência de informações essenciais sobre a saúde mamária e nos mostram um quadro crítico no qual o cuidado com as mamas não é um direito compreendido e acessado para todas as brasileiras”.

A pesquisa também destaca a preocupação com a realização de mamografias, que teve um aumento tímido em 2023 em relação aos anos anteriores, após uma queda significativa durante a pandemia. A taxa de cobertura de exames ainda é insatisfatória, atingindo apenas 23,4% do público-alvo, enquanto a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda uma cobertura de 70%. Esses dados ressaltam a urgência de campanhas de conscientização e políticas que promovam a equidade no acesso a informações e serviços de saúde para todas as mulheres.

Fonte: Veja

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