[ENTREVISTA] Entenda o que é Oncologia Clínica

Esta entrevista foi realizada por Leíria Rodrigues, jornalista, que entrevistou o Dr.Sâmio Ferreira, e gentilmente nos enviou para publicação em nosso portal!

Leíria Rodrigues - Explique um pouquinho do se trata a oncologia clínica.

Sâmio Ferreira - A oncologia clínica é uma especialidade médica. Ela é responsável pelo tratamento medicamentoso dos diversos tipos de câncer (quimioterápico, hormonioterápico, imunoterápico, terapias alvo-moleculares).

A radioterapia e a cirurgia oncológica também são especialidades médicas, responsáveis pelo tratamento radioterápico (teleterapia, braquiterapia) e cirúrgico respectivamente, dos diversos tipos de câncer.

Leíria Rodrigues - Quando se fala em Oncologia, tem-se a idéia de que ela anda lado a lado com o tratamento do câncer. É isso mesmo?

Sâmio Ferreira - A oncologia é responsável pelo diagnóstico, tratamento curativo e, nos casos avançados, nos quais o câncer não é mais possível ser curado, tratamento paliativo que visa aumentar o tempo de vida do paciente, melhorar a qualidade de vida e também proporcionar uma morte digna.

Leíria Rodrigues - Como a Oncologia ajuda a tratar o câncer?

Sâmio Ferreira - Ela ajuda a tratar o câncer através das suas várias formas de tratamento: cirurgia, quimioterapia, radioterapia, hormonioterapia etc. Normalmente, os cânceres necessitam de mais de uma forma de tratamento oncológico. Por exemplo, no câncer de mama se faz inicialmente o tratamento cirúrgico (mastectomias ou cirurgias conservadoras da mama) e posteriormente, caso haja indicação, quimioterapia e radioterapia pós-operatórias.

Leíria Rodrigues - Um dos tratamentos oncológicos para o câncer que se ouve falar com mais frequência é a quimioterapia, e outro é a radioterapia. Esses são os mais recomendados? Você pode explicar cada um deles?

Sâmio Ferreira - Os três principais tratamentos para o câncer são a cirurgia, a radioterapia e a quimioterapia. Não é possível falar, de maneira geral, que uma dessas terapias é mais importante que as outras, já que as três se complementam no tratamento do câncer.

A radioterapia é responsável pelo controle local do câncer, ou seja, diminuir ou fazer desaparecer o tumor no local onde as radiações ionizantes penetram no corpo do paciente. A liberação das radiações ionizantes é feita por aparelhos chamados aceleradores lineares.

As duas principais formas de aplicação da radioterapia são a teleterapia e braquiterapia. Na teleterapia, o aparelho que emite as radiações fica longe do local do câncer, enquanto que na braquiterapia, existe o contato direto do câncer com a radiação ionizante.

A quimioterapia é responsável não só pelo controle local do câncer, como também pelo controle das micrometástases circulantes nos nossos vasos sanguíneos ou linfáticos que irão depositar-se nos diversos órgãos (metástases).

As quimioterapias são medicamentos que são diluídos em soros e aplicados na veia dos pacientes. Elas agem nas células do câncer que estão crescendo desordenadamente.

Leíria Rodrigues - Estes tratamentos variam de acordo com o tipo de câncer?

Sâmio Ferreira - O tratamento oncológico para cada tipo de câncer é diferente. Por exemplo: os linfomas costumam ser bastante sensíveis ao tratamento quimioterápico e nestas doenças não é realizado nenhum tratamento cirúrgico. Já o câncer de rim e o melanoma são tumores que costumam ser resistentes ao tratamento com quimioterapia.

Leíria Rodrigues - Há outros tratamentos oncológicos que não são tão aplicados ou não são tão conhecidos?

Sâmio Ferreira - Alguns tipos de tratamento oncológico são pouco conhecidos do público leigo, como a hormonioterapia que é indicada principalmente nos cânceres de mama, próstata e endométrio, as imunoterapias (interferon, interleucinas e vacinas) mais indicadas nos cânceres de rim e melanoma. O transplante também é um tipo de tratamento oncológico que é indicado principalmente nos linfomas e nas leucemias.

Leíria Rodrigues - Há relatos, em especial por pacientes que já passaram por alguns desses tratamentos, de reações causadas pelos remédios. São os efeitos colaterais, não é isso? O tipo de câncer influencia ou os efeitos são os mesmos para todos os tipos?

Sâmio Ferreira - Infelizmente, as medicações quimioterápicas matam ou danificam não só as células cancerígenas, mas também as células normais do nosso organismo. Isso justifica os principais efeitos colaterais da quimioterapia: queda do cabelo (ação nas células folículo piloso), náusea e vômitos (ação nas células da mucosa do estômago e do intestino) e anemia, infecções e sangramentos (ação nas células da medula óssea respectivamente hemácias, leucócitos e plaquetas).

A intensidade e tipo dos efeitos colaterais dos quimioterápicos estão muito mais relacionados com o tipo de medicação utilizada e da predisposição individual de cada paciente do que do tipo específico de câncer.

Leíria Rodrigues - O que acontece exatamente no organismo quando o paciente recebe a quimioterapia ou a radioterapia?

Sâmio Ferreira - Após as aplicações de quimioterapia ou radioterapia, as drogas ou as radiações ionizantes destroem, através de vários mecanismos de ação, não só as células do câncer, mas também as células normais dos diversos órgãos. Cada quimioterápico promove efeitos colaterais específicos, eles têm predileção por determinados órgãos. Por isso não podemos generalizar que todo paciente que faz quimioterapia tem queda de cabelo, vomita muito ou tem anemia.

Também é importante relatar que os pacientes que têm o mesmo tipo de câncer e que fazem quimioterapias idênticas podem ter intensidade de efeitos colaterais bem diferentes, dependendo da predisposição individual de cada paciente.

Leíria Rodrigues - Hoje o Brasil é um país considerado avançado no campo oncológico? E a região Norte?

Sâmio Ferreira - Sem dúvida, o Brasil já é considerado uma referência mundial no campo da oncologia. Temos vários serviços com tecnologia de ponta, assim como vários serviços com produção científica robusta na área da oncologia.

Na Região Norte, as cidades de Belém e Manaus contam com várias clínicas especializadas em oncologia, hospitais e serviços de radioterapia que conseguem fazer os mesmos tratamentos oncológicos que são feitos no sudeste do Brasil e no resto do mundo.

Leíria Rodrigues - O que se tem de novo na oncologia que pode ser considerado um avanço científico?

Sâmio Ferreira - Em minha opinião, os principais avanços científicos na área da oncologia foram dois: 1) Surgimento de várias medicações para melhor controle de vários sintomas: dor, náuseas e vômitos, anemia, baixa da imunidade. Estas medicações melhoraram muito a qualidade de vida de muitos doentes com câncer; 2) Surgimento de novas drogas, que chamamos de terapia alvo moleculares, que tem como objetivos atingir alvos específicos da célula cancerígena, sem lesar as células normais do organismo, o que leva a menos efeitos colaterais relacionados ao tratamento oncológico.

Leíria Rodrigues - Você trabalhou durante vários anos com pacientes considerados terminais, com poucas chances de sobrevivência e, durante essa sua experiência, desenvolveu-se um trabalho que mudou um pouco esta perspectiva. Esse trabalho mostrou que é possível cuidar e dar amor para aliviar a dor de alguém nos seus últimos dias de vida, sempre com um olhar de esperança. Isso foi chamado de tratamento paliativo. Como esse tratamento era introduzido na vida do paciente?

Sâmio Ferreira - Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), no seu conceito de 2002, os cuidados paliativos são uma filosofia de cuidados, realizado por uma equipe multiprofissional, que tem como objetivo melhorar a qualidade de vida dos pacientes e familiares de pacientes com doenças crônicas, progressivas e ameaçadoras da vida, através do alívio do sofrimento físico, psíquico, social e espiritual.

A OMS recomenda que os cuidados paliativos devam ser iniciados junto com o diagnóstico e a terapêutica específica do câncer.

Os cuidados paliativos tem quatro metas fundamentais: trabalho em equipe, apoio à família, tratamento dos sintomas e comunicação adequada das más notícias.

Estar fora de possibilidade de cura não significa estar fora de possibilidade de vida, e é por este motivo, que, independente da intenção do tratamento oncológico, ou seja, se é curativo ou paliativo, o paciente e sua família devem ser tratados com respeito, oferecendo todas as informações necessárias para que eles possam ter autonomia plena para tomar decisões a respeito do seu tratamento e das suas vidas.

Na fase de tratamento paliativo propriamente dito, na qual não existe mais nenhum tratamento oncológico, e o câncer irá evoluir inexoravelmente até a morte. Nesta fase, os objetivos principais são a melhora da qualidade de vida dos pacientes e familiares, assim como proporcionar uma morte com o mínimo de sofrimento possível.

Nos cuidados paliativos, dizemos que o doente passa a ser mais importante que a doença para a equipe profissional que os cuida, ou seja, que a biografia supera a biologia...

Leíria Rodrigues - Poxa que informação boa! Nesses momentos, em especial de uma doença, é importante o afeto e a solidariedade. Mas, pode ser aplicado não só a paciente em estado terminal, mas em todos os pacientes que estão passando por algum tratamento mais difícil, não é mesmo?

Sâmio Ferreira - Sim, é importante salientar que os cuidados paliativos não são exclusivamente para pacientes oncológicos, mas também para todo paciente com doença crônica, progressiva e ameaçadora da vida, como os pacientes geriátricos demenciados, sequelados de AVC, SIDA/AIDS, insuficiências renais, cardíacas, hepáticas e pulmonares, pediátricos oncológicos e pediátricos com doença crônica.

Como já falado na questão anterior, a OMS recomenda que os cuidados paliativos sejam iniciados desde o início do diagnóstico e tratamento oncológico específico.

Leíria Rodrigues - Essa experiência foi tão bem sucedida, que virou até um livro. Você pode comentar um pouco?

Sâmio Ferreira - Tempo de Amor, a essência da vida na proximidade da morte, livro escrito por mim com outras duas médicas, Maria Goretti Sales Maciel e Maria das Graças Mota Cruz. Mostra com arte e beleza o final da vida de alguns pacientes que faleceram por câncer em uma enfermaria de cuidados paliativos em São Paulo.

Este livro foi feito para divulgar o Serviço de Cuidados Paliativos do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo. Foi feito com pacientes matriculados neste serviço e que se encontravam no final de suas vidas. Além da divulgação do serviço e da filosofia dos cuidados paliativos, este livro mostra que o momento do final da vida pode ser muito rico para a equipe, o paciente e seus familiares, através de trocas de sentimentos, despedidas, perdões, reflexões sobre o sentido da vida, solidariedade, carinho, amor, etc.

Leíria Rodrigues - E hoje, Dr. Sâmio, pode-se ter um cenário promissor para a cura do câncer?

Sâmio Ferreira - Em minha opinião, apesar de todos os avanços científicos na área da oncologia, ainda estamos longe de curarmos todos os pacientes com câncer.

Não existe um único tratamento que seja capaz de curar todos os pacientes oncológicos, pois são doenças com evolução e agressividade muito diferentes.

Os cânceres potencialmente curáveis são aqueles que foram diagnosticados precocemente, em estágio inicial da evolução da doença.

Os exames de rastreamento como mamografia anual nas mulheres a partir dos 50 anos, Papanicolau anual (preventivo) para todas as mulheres com vida sexual ativa, e o toque retal com dosagem de PSA anuais nos homens acima dos 50 anos, são extremamente importante para o diagnóstico inicial dos cânceres de mama, colo uterino e de próstata, respectivamente. Desta forma, estes tumores podem ser curados se o diagnóstico e o tratamento forem iniciados o mais rápido possível.

Leíria Rodrigues - E quando se descobre um câncer, quais os melhores caminhos, além de procurar médicos que cuidam da doença? Temos muito medo ainda de falar, de conhecer ou até mesmo de acompanhar pessoas que estão com câncer. Como devemos agir?

Sâmio Ferreira - Sem dúvida, o primeiro passo é a procura de especialistas na área de oncologia para orientação do melhor tratamento a ser realizado para cada tipo específico de câncer.

Também é muito importante tirar todas as dúvidas com o oncologista a respeito do diagnóstico, dos tratamentos, da intenção de tratamento, se é paliativa ou curativa, assim como da evolução da doença. Essa conversa franca é importante desde o início do tratamento, pois ela além de diminuir a ansiedade do paciente e dos familiares, também fortalece a relação médico-paciente.

Caso haja demanda, dependendo de cada caso, o paciente pode ser encaminhado para outros profissionais: psicólogo, nutricionista, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, pois normalmente o tratamento oncológico é multiprofissional.

Sempre que tiver dúvidas a respeito do seu câncer, o paciente deve rapidamente solucioná-las com o seu médico oncologista. Nunca comparar o seu câncer com o câncer de algum conhecido, já que as doenças são diferentes, os tratamentos são diferentes, assim como as evoluções e os efeitos colaterais de cada câncer são diferentes. O tratamento oncológico nos dias atuais é personalizado.

Nota sobre a autora da entrevista

Aos 37 anos de idade, depois de ter amamentado quatro lindos filhos, entre eles dois gêmeos, descobri no dia 23 de janeiro de 2012, um câncer na mama esquerda. Uau! Era comigo, Leíria Rodrigues, que durante muito tempo, como radialista no Programa De Mulher para Mulher, na Rádio Rural de Santarém, falava sobre os cuidados com nossas queridas ouvintes! E foi lá que conheci a médica mastologista, santarena, Angeluce Santos, no quadro entrevista com especialista. E justamente essa querida médica, que se tornou amiga, me deu o diagnóstico! Na época, também estava no meio do Curso de Pós Graduação em Jornalismo Científico na Universidade Federal do Oeste do Pará... Daí aumentou minha vontade em continuar como jornalista falando da importância da Ciência em minha vida... E, claro, do jornalismo também! À minha turma e aos professores dedico esse bate papo científico com Sâmio Pimentel Ferreira, médico oncologista clínico, do Hospital Ofir Loyola. Conheça um pouco da história maravilhosa desse médico, paraense, que cuida com amor e seriedade de centenas de pacientes com câncer!

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