[ENTREVISTA] O que é Câncer relacionado ao Trabalho?

O Blog Cuide Bem da Sua Pele conversou com a pesquisadora da Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro/Ministério do Trabalho e Emprego), Dra. Claudia Carla Gronchi, a respeito do câncer ocupacional - representado por neoplasias que se relacionam à exposição do trabalhador a agentes cancerígenos presentes no ambiente de trabalho.

Especialista em Engenharia de Segurança do Trabalho e em Higiene Ocupacional, Doutora na área de Tecnologia Nuclear, a pesquisadora discorreu sobre temas como as diretrizes brasileiras para o câncer relacionado ao trabalho e políticas públicas desenvolvidas no país.

Para a Dra. Claudia, os casos de câncer de pele relacionado ao trabalho são subestimados, devido à dificuldade de relacionar a doença à exposição ocupacional. A pesquisadora menciona que "Cabe ao empregador adotar medidas de controle da exposição, informar o trabalhador sobre o risco e capacitá-lo para exercer suas atividades com segurança”.

Confira a entrevista na íntegra.

Instituto Oncoguia: Para começarmos, o que é câncer ocupacional?

Dra. Claudia - Câncer ocupacional é aquele relacionado com a exposição do trabalhador, durante a sua vida laboral, a agentes cancerígenos presentes no ambiente de trabalho. Este tipo de câncer pode aparecer no organismo do trabalhador mesmo após a cessação da exposição.

Instituto Oncoguia: Qual a diferença entre câncer ocupacional e câncer relacionado ao trabalho?

Dra. Claudia - As "Diretrizes para a vigilância do câncer relacionado ao trabalho” de 2012 do INCA descrevem o câncer ocupacional como aquele que possui uma relação direta com as condições de trabalho, e o câncer relacionado ao trabalho como resultado da exposição do trabalhador a substâncias no seu ambiente de trabalho que aumentam o risco de desenvolver um câncer.

Instituto Oncoguia: Que tipos de câncer estão dentro do grupo do câncer ocupacional?

Dra. Claudia - A Portaria do MS/GM nº 1.339, de 1999, reconhece 11 tipos de câncer como decorrentes da exposição ocupacional. Dentre eles e de acordo à Classificação Internacional de Doenças (CID), encontra-se a neoplasia maligna da pele cujo fator de risco de natureza ocupacional é a radiação ultravioleta.

Instituto Oncoguia: As diretrizes brasileiras para a vigilância do câncer relacionado ao trabalho estão em concordância com aquelas pontuadas por países que desenvolvem ações efetivas em torno do tema?

Dra. Claudia – Sim. A Diretriz brasileira está em consonância com o movimento internacional para controlar a exposição ambiental e ocupacional a agentes cancerígenos.

Instituto Oncoguia: Fale um pouco mais desse movimento internacional. Este olhar maior para a questão representa algo novo?

Dra. Claudia - Eu não sei dizer se é algo novo ou não, mas está acontecendo a nível internacional, por países que estão mais conscientes da situação. No Brasil, com a globalização, com as tecnologias que fazem a informação circular tão rapidamente, está havendo um forte movimento de conscientização.

Instituto Oncoguia: Falando sobre isso, que país ou que países a senhora acredita que estão mais avançados?

Dra. Claudia - De uma maneira geral, os países desenvolvidos possuem políticas públicas voltadas para o câncer relacionado ao trabalho. Na Austrália desde a década de 60 são realizadas campanhas de esclarecimento e prevenção dos riscos da radiação ultravioleta solar. Essas ações contribuíram para diminuir a incidência de câncer de pele, principalmente o melanoma, que é uma neoplasia maligna que se não for diagnosticada cedo pode ser letal.

Instituto Oncoguia: E nós, onde estamos? Há políticas públicas em andamento no país?

Dra. Claudia - No Brasil existem estudos, pesquisas e campanhas de conscientização na área de saúde pública. Mas, precisamos, também, ter mais ações voltadas à prevenção do câncer de pele de origem ocupacional. A publicação das Diretrizes para a vigilância do câncer relacionado ao trabalho representa um passo importante para o desenvolvimento de políticas públicas voltadas à prevenção do câncer ocupacional no país.

Instituto Oncoguia: Falando sobre câncer de pele relacionado ao trabalho, como se dá a exposição ocupacional? Quais os agentes e fatores de risco da exposição?

Dra. Claudia - A exposição ocupacional ocorre quando o trabalhador ao desenvolver suas atividades está exposto à fonte de radiação ultravioleta sem nenhum tipo de controle efetivo de caráter coletivo ou individual. Os efeitos à saúde do trabalhador dependem da duração e da frequência da exposição, da intensidade da radiação solar e do fototipo da pele.

Instituto Oncoguia: No caso do câncer de pele relacionado ao trabalho. Há registros de casos suficientes (tais como ocupação e atividades econômicas mais atingidas) para a definição e desenvolvimento de políticas públicas?

Dra. Claudia - No Brasil, os casos de câncer de pele ainda são subestimados devido à dificuldade de relacionar a doença com a exposição ocupacional.

Instituto Oncoguia: A Sra. disse que é difícil relacionar o câncer de pele à exposição ocupacional. Fale mais sobre isso, por favor.

Dra. Claudia – O diagnóstico do tumor, geralmente, é feito independente de ser ou não ocupacional. Não se leva em consideração à ocupação dos trabalhadores e pode-se encontrar nos prontuários dos pacientes informações genéricas. Mas, em função do aumento do número de casos de câncer de pele, acredito que hoje há uma preocupação maior e cuidado em se traçar o nexo causal, o que no passado era mais difícil.

Instituto Oncoguia: Em que ramos de atividades econômicas estão os profissionais mais vulneráveis aos fatores de risco do câncer de pele melanoma e não melanoma?

Dra. Claudia - Os trabalhadores da agricultura, da mineração a céu aberto, da construção civil e da pesca, dentre outras, estão expostos a Radiação Ultravioleta (RUV) solar e dependendo da estação do ano, da latitude e altitude da região em que desenvolvem suas tarefas, estão expostos a altos índices de RUV.

Instituto Oncoguia: Pensando nos setores produtivos que colocam os trabalhadores em situação de risco (tais como construção civil, gaseificação de carvão, pesca, produção de coque, trabalho rural, refinaria de petróleo, indústria de produtos minerais não metálicos, indústrias têxteis), em sua opinião, deveria ser uma responsabilidade, também, de gestão ‘proteger’ os seus colaboradores?

Dra. Claudia - É responsabilidade do empregador em proporcionar um ambiente de trabalho seguro e saudável, com a implantação de medidas de controle seja de caráter coletivo, individual ou administrativo. O empregador deve também assumir o papel de sensibilizar os seus colaboradores sobre a questão. Isso, sem dúvidas, é a sua obrigação.

Instituto Oncoguia: Há alguma ação que vale destacarmos com relação às medidas de controle que uma empresa tenha implementado ou possa implementar?

Dra. Claudia - Há muito incentivo ao uso do protetor solar, isso é muito positivo. Mas alguns pontos devem ser levados em consideração sobre este tipo de proteção. Por exemplo, quantas vezes esse protetor deve ser usado durante o dia? Qual a quantidade necessária que devemos aplicar na pele? E se o trabalhador trabalha sob o sol e transpira excessivamente? Essa situação diminui a eficiência da proteção. O ideal seria o fornecimento de roupa confeccionada com uma trama bem pequena que impede a passagem de radiação ultravioleta, chapéus de abas largas e óculos com lentes de proteção a radiação ultravioleta.

Instituto Oncoguia: O que são os EPIs (equipamento de proteção individual) quem regulamenta e fiscaliza seu uso?

Dra. Claudia - A norma regulamentadora 6 da Portaria nº 3.214 do Ministério do Trabalho, define que EPI é todo dispositivo ou produto, de uso individual utilizado pelo trabalhador, destinado à proteção de riscos suscetíveis de ameaçar a segurança e a saúde no trabalho.

Essa norma dispõe que todo equipamento de proteção individual, de fabricação nacional ou importado, só poderá ser posto à venda ou utilizado com a indicação do Certificado de Aprovação - expedido pelo órgão nacional competente em matéria de segurança e saúde no trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego.

Instituto Oncoguia: E os profissionais, como podem, eles mesmos, protegerem-se? Onde informar-se, orientar-se?

Dra. Claudia - Atualmente existe muita informação sobre o risco e medidas de proteção sendo disseminada nos meios de comunicação, mas cabe ao empregador adotar medidas de controle da exposição, informar o trabalhador sobre o risco e capacitá-lo para exercer suas atividades com segurança.

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