Fórum Nordeste de Políticas de Saúde em Oncologia

No dia 27 de agosto, o Oncoguia realizou o I Fórum Nordeste de Políticas de Saúde em Oncologia em São Luís, no Maranhão. Confira abaixo como foram os debates. 

  • Abertura

Luciana Holtz, Fundadora e Presidente no Instituto Oncoguia

Falou sobre o trabalho do Oncoguia, apresentou dados de 2018 e destacou a importância do registro de dados do câncer no Brasil, de se discutir o câncer e desmistificá-lo e perder o medo, além da importância da multidisciplinaridade no tratamento da doença.

Luciana ainda apresentou dados da pesquisa sobre a percepção brasileira sobre o câncer feita pelo Oncoguia em parceria com o Ibope. 100% das pessoas conhecem alguém com câncer e 81% têm alguém próximo com a doença. Pessoas reconhecem que o câncer tem mais chance de cura se diagnosticado no início e que há muitas novidades sobre o assunto, mas 38% dos brasileiros ainda têm perspectiva negativa sobre a doença: 1/3 acredita que é causado por traumas psicológicos, 8% não sabem da relação com tabagismo e 1/3 não sabem da relação com obesidade. Além disso, 51% dos entrevistados para a pesquisa acreditam que o maior impacto do câncer é emocional.

  • Abertura Contextual

Ronald Coelho, Oncologista no Hospital do Câncer do Maranhão

O oncologista comentou sobre a realidade do Maranhão ser bastante diferente da do restante do Brasil. No restante do país, o câncer mais frequente em mulheres é o de mama e em homens o de próstata. No Maranhão, colo do útero e pênis são os mais frequentes. Uma realidade bastante particular do Nordeste e o que existe de comum ao câncer do colo do útero e de pênis é o HPV.

Segundo Ronald, vacinação e captura híbrida são medidas que podem erradicar o HPV em até 80 anos, porém no Maranhão a captura híbrida não é uma medida adotada no SUS e a cobertura de vacinação está muito abaixo do preconizado pelo Ministério da Saúde. Ele ainda destacou que a cidade de Ribamar é um exemplo no controle da doença e o Hospital do Câncer de São Luís também é um bom exemplo na questão de acesso a medicamentos de alto custo.

Eduardo Braide, Deputado Federal na Câmara dos Deputados

Braide destacou em sua fala a criação da PEC 60/2019, emenda à Constituição que cria o Fundo Nacional de Prevenção e Combate ao Câncer que destina recurso de 3% do IPI de cigarros e derivados de tabaco e 1% do IPI de bebidas alcóolicas para a prevenção, diagnóstico e tratamento do câncer. No Maranhão, já existe um Fundo Estadual semelhante e que vem beneficiando muitos pacientes da região.

Carlos Lula, Secretário de Saúde do Estado do Maranhão

O secretário de saúde destacou a falta de hospitais dedicados ao tratamento do câncer no Estado até 2015. Desde então, o Estado passou a ter radioterapia e oncologia pediátrica, em Imperatriz; uma primeira unidade de oncologia no leste do Estado em Caxias; e a criação de um hospital dedicado exclusivamente ao tratamento do câncer em São Luís, além de outras parcerias para o tratamento da doença. Para ele, o desafio agora é ampliar os serviços dentro da realidade econômica da região.

Carmen Lucia, secretária adjunta da Secretaria de Saúde do Estado do Maranhão também esteve no fórum e destacou que dentre os muitos desafios, o Estado optou por priorizar o acesso ao tratamento e a prevenção do câncer. Além de estruturas físicas, o Maranhão também conta com unidades móveis de diagnóstico para câncer de mama e do colo do útero que rodam por todo o Estado realizando um trabalho de conscientização e de exames diagnósticos para estes dois tipos de tumor.

  • Combate ao HPV no Nordeste: desafios e prioridades

Angélica Nogueira Rodrigues, Oncologista e Presidente do EVA - Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos

A palestrante destacou alguns aspectos importantes para o combate ao HPV e consequente prevenção a tumores HPV relacionados no Estado do Maranhão e em todo o Brasil. Ela reforçou que o câncer do colo do útero é uma doença evitável, mas que algumas barreiras atrapalham a prevenção e conscientização, entre ela questões culturais, limitação de informações, dificuldade de acesso a exames de qualidade, resultados e tratamento.

Angélica destacou ainda a importância e a relevância do exame de Papanicolaou para a saúde da mulher, na prevenção secundária e no diagnóstico precoce do HPV e o alto poder de impacto da vacina contra o HPV no controle da doença. Destinada a meninas de 9 a 14 anos e a meninos de 11 a 14 anos, a médica ressaltou a importância de que pediatras endossem a importância da vacina para pais de adolescentes a fim de aumentar a adesão à mesma.

Ana Goretti Kalume Maranhão, Coordenadora no Programa Nacional de Imunização (PNI) do Ministério da Saúde

Ana Goretti apresentou vários dados nacionais e regionais importantes sobre a vacinação contra o HPV, que faz parte do calendário nacional de imunização desde 2014, estando disponível gratuitamente em 37 mil postos de saúde de todo o Brasil para meninas de 9 a 14 anos e meninos de 11 a 14.

Segundo a especialista, a cobertura nacional ideal seria de 80% da população alvo. Porém no Brasil, a taxa de cobertura em meninas é de 72% para a primeira dose da vacina e de 51% para a segunda dose, que deve ser tomada seis meses depois da primeira. Para meninos, a taxa de cobertura é ainda menor: 49% para a primeira dose e 23% para a segunda. No Maranhão, as taxas de imunização feminina seguem a média nacional, porém a masculina fica ainda mais abaixo: 46% para a primeira dose e 20% para a segunda. No Nordeste, o câncer do colo do útero é o 3º mais frequente e a 2ª causa de morte por câncer. Ela aponta que este é um panorama bastante negativo considerando uma doença prevenível.

Ana Goretti ainda destacou a importância da vacinação de meninos considerando-se que o homem é o grande transmissor do HPV e também pode desenvolver alguns tipos de câncer associados ao vírus como pênis, ânus, orofaringe.

Dentre os desafios apontados pela palestrante para o sucesso da vacina estão levar de volta a vacinação para as escolas, a desinformação, mitos e fake news e o movimento anti-vacinação.

  • Oncologia Sustentável, Justa e Efetiva

Nivaldo Farias Vieira, Médico Oncologista e Diretor Médico da Clínica OncoHematos

O oncologista destacou alguns dados sobre o câncer no Brasil e no mundo destacando que os cânceres de mama e próstata são os mais prevalentes no país, porém em algumas regiões do Nordeste, os tipos de câncer mais frequentes são colo do útero e pênis. Segundo dados apresentados por ele, 90% dos casos de câncer do colo do útero são preveníveis. Outra informação impactante apresentada por Nivaldo foi a de que o Maranhão é campeão brasileiro de amputação de pênis por causa de tumores no órgão. Ele reforçou que estes números poderiam ser muito menores com educação, informação e prevenção. Depois disso, as prioridades são o acesso a uma rede para diagnóstico de qualidade e acesso a tratamento.

  • Como garantir acesso a diagnóstico precoce: desafios e prioridades

Clóvis Klock, Presidente da Sociedade Brasileira de Patologia (SBP)

Clóvis destacou que grande parte do problema do diagnóstico de pacientes com câncer está associado à dificuldade de acesso à biópsia. Segundo ele, uma biópsia de qualidade precisa respeitar alguns processos básicos como: o material coletado precisa ser fixado em formol 10% em frasco tamponado e enviado ao laboratório de patologia em no máximo 72 horas, se não isso prejudica todos os exames subsequentes que darão o diagnóstico ao paciente. Mas a realidade não funciona bem assim. Segundo o especialista, além de serem armazenados inadequadamente, muitos materiais precisam viajar para outras cidades e até estados, demorando meses e às vezes até mesmo anos para serem examinados. Tudo isso se deve à defasagem de patologistas e laboratórios de patologia em muitas cidades do Brasil ocasionada pela dificuldade de formação de patologistas e pela baixa remuneração do setor, principalmente no interior.

Heberth Bezerra, Coordenador da Central de Marcação de Consultas e Regulação Ambulatorial (CEMARC)

Heberth apresentou o case local de como o Estado se organizou para melhorar o atendimento a pacientes com câncer. Hoje, a cidade de São Luís conta com 23 unidades de marcação de consultas e regulação ambulatorial, sendo uma delas dedicada exclusivamente a pacientes prioritários. Antes, a cidade contava com apenas uma unidade de marcação centralizada e com datas específicas para agendamento. Hoje também segue o Sistema de Regulação Ambulatorial do Ministério da Saúde (SISREG), que é usado em todo o país, possibilitando o acesso a dados dos pacientes de forma organizada e unificada, permitindo assim maior controle dos processos, mensuração e correção de gargalos.

José Klerton Luz Araújo, Oncologista Clínico e Diretor médico do Hospital de Câncer do Maranhão

O oncologista apresentou em sua fala os principais desafios do gestor estadual no diagnóstico do câncer. Segundo ele, o Estado do Maranhão é muito extenso e por isso é preciso avaliar questões de custo, pois muitos pacientes precisavam se deslocar de outras regiões até a capital para terem acesso a tratamento, o que aumentava as despesas do Estado. Em sua percepção, a solução é seguir descentralizando o atendimento, como hoje já começou a ser feito com as unidades de câncer em Caxias e Imperatriz, o que já garantiu um leque maior de oportunidades para pacientes e uma certa redução de custos para o governo estadual.

Ele ainda apontou que o maior desafio é a conscientização e o trabalho para o diagnóstico precoce e para o tratamento de qualidade, pois muitos pacientes já chegam aos hospitais em estágio avançado. Outros desafios pontuados foram: olhar para os pacientes de acordo com a realidade de cada um, ter um olhar mais humano e personalizado para tratar cada um conforme suas necessidades; garantir que o Estado tenha capacidade para diagnosticar e tratar todos os casos, pois há profissionais capacitados para isso. E como soluções, José Klerton propôs a criação de uma linha de cuidado para pacientes, criação de um fluxo de referência e contra referência especializados, colocar a rede secundária para realizar biópsias, fazer valer a lei dos 60 dias, intensificar a atuação da rede de atenção primaria e secundaria e agilizar acesso ao hospital de referência para início de tratamento, além da revisão dos tetos de municípios e estados e o monitoramento e a avaliação dos serviços periodicamente.

Lula Fylho, Secretário de Saúde do Município de São Luís

Lula Fylho apresentou o desafio do gestor municipal no diagnóstico do câncer. Segundo ele, todos procedimentos e consultas do SUS são subfinanciados. Na oncologia, ele destacou que São Luís recebe por ano mais de 3.100 milhões de reais para quimioterapia, mas o gasto anual chega a 19 milhões; em radioterapia o recurso que entra é de 3.600 milhões, mas os gastos são de 6.400 milhões. Para não dever, o município precisa arcar com o déficit de gastos. O que prejudica o investimento na atenção primária, que poderia desafogar os hospitais. Mas como ele destacou, o ciclo já dura muito tempo e não dá para parar de gastar com hospitais para investir na atenção básica. Assim, ele aponta como o principal desafio da gestão fazer o equilíbrio entre o pouco recurso que entra e as grandes demandas que existem. Ele ainda destacou a burocracia nos procedimentos para atender gargalos, ressaltando a dificuldade que é atender pacientes que precisam de atenção imediata para terem mais chances de vida enquanto a gestão se depara com tanta burocracia e falta de recursos.

Adriana Mota, Secretária Adjunta de Saúde de São José de Ribamar

Adriana contou sobre a experiência com o programa municipal de combate ao HPV em São José de Ribamar e para controle dos cânceres de mama e colo do útero na cidade.

Por lá, uma das medidas que tem funcionado bem é o programa Saúde na Escola que permitiu alcançar uma adesão de 80% na vacinação contra o HPV nos últimos anos. A cidade também conta com uma rede estruturada para atender mulheres com foco no diagnóstico precoce e tratamento de câncer de mama e do colo do útero. Dessa forma, mulheres com lesões ou suspeita de câncer de mama passam por monitoramento e acompanhamento desde a atenção básica até a conclusão do tratamento.

  • Desafios do acesso a um tratamento rápido, atual e de qualidade

Amanda Figueiredo B. Azevedo, Gerente de organização das farmácias de Pernambuco da assistência farmacêutica de PE

Amanda destacou que ter o tratamento certo, na dose certa e no tempo oportuno também é uma angústia que permeia a assistência farmacêutica em Pernambuco. Ela questionou o modelo de pagamento via APAC que acaba não cobrindo o valor dos tratamentos de que os pacientes necessitam. Assim, a judicialização se apresenta como um grande problema regional que prejudica, inclusive, o investimento na atenção primária deixando o Estado sem saber de onde tirar dinheiro. A palestrante ressaltou que apesar da dificuldade de acesso a tratamento, Pernambuco tem o privilégio de contar com muitos especialistas e um atendimento descentralizado. Ela ainda destacou a existência de alguns protocolos estaduais que funcionam para pacientes com câncer de mama, tipo de câncer com maior incidência no Estado e também para Linfoma Não Hodgkin e Leiomioma Múltiplo, garantindo a pacientes destas doenças acesso a tratamentos mais modernos antes mesmo de serem incorporados pelo Ministério da Saúde.

Maria de Fátima Rocha Ribeiro da Silva, Coordenadora de Redes de Apoio Especializada da Área Técnica de Oncologia na Secretaria de Saúde do Estado da Bahia

Maria de Fátima falou sobre a experiência da Bahia em relação ao plano de atenção ao câncer. Ela apresentou dados regionais de registro de câncer no Estado e destacou que os óbitos vem se mantendo estáveis enquanto que o número de casos diagnosticados tem aumentado nos últimos anos, o que é um ponto positivo, pois comprova que o trabalho para diagnóstico precoce que vem sendo feito tem sido efetivo. Com isso, além de tratar mais rápido e melhor os pacientes, diminui-se os custos. Ela contou sobre a elaboração do plano de atenção ao câncer na Bahia destacando as principais dificuldades e fragilidades identificadas na rede. Em cima destes pontos, foram estipulados objetivos, princípios e diretrizes de trabalho para se alcançar o que era esperado.

Maria da Glória Mafra Silva, Promotora de Justiça titular da 19ª Promotoria de Defesa da Saúde da Comarca de São Luís

A promotora destacou uma particularidade da promotoria de São Luís que é a participação da defesa da saúde nas esferas de improbidade, criminal e de assistência. Assim, é possível fazerem um trabalho que busca a adequação de condutas junto a gestores e pacientes. Segundo Maria da Glória, algumas das principais dificuldades são a ausência de protocolos de acesso à regulação, assistencial e terapêutico, o que acaba prejudicando o gerenciamento. Com essa ausência de protocolos, fica difícil saber quais instrumentos de planejamento devem ser trabalhados.

  • Encerramento

Luciana Holtz, Fundadora e Presidente no Instituto Oncoguia falou com a Presidente do Instituto Roda da Vida, Paola Tôrres

Paola é médica e ex-paciente oncológica. No Roda da Vida, ela trabalha com medicina integrativa, área que costuma ser marginalizada por muitos médicos. Segundo ela, a medicina integrativa não trata do câncer ou de outras doenças, e sim trata de pessoas promovendo cuidado integral com atividades como ioga, reiki e medicina ayurvédica. Para a especialista, a promoção de saúde ajuda as pessoas a atravessar por algumas doenças como o câncer de uma forma melhor. Além disso, a medicina integrativa trata de cuidar das pessoas de forma mais humana, com atenção aos cuidados das pessoas consigo mesmas.

 

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