[MATÉRIA] Rastreamento: eficaz para a redução das mortes por câncer de pulmão?

Considerada uma neoplasia rara até o início do século XX, o câncer de pulmão é hoje uma doença de altíssima incidência e cercada de desafios.

Um dos tipos mais frequentes de câncer em todo o mundo, a neoplasia é diagnosticada em estágio avançado em mais de 80% dos casos e, por isso, é aquela que ocasiona o maior número de óbitos por câncer no mundo. Somente em 2008, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estimou 1,52 milhão de novos casos e 1,31 milhão de mortes decorrentes da doença.

No Brasil, dos 520 mil novos casos de câncer previstos para 2012, estima-se que 17.210 sejam de pulmão, sendo 18 novos casos a cada 100 mil homens e de 10 a cada 100 mil mulheres.

A razão principal da mudança de ‘status’ do câncer de pulmão no último século é, sem dúvidas, o aumento colossal do consumo de tabaco, responsável por cerca de 90% dos casos da neoplasia; embora esforços em todo o mundo venham sendo empenhados com sucesso para persuadir populações a abandonar o hábito de fumar, os prejuízos causados pelo fumo ainda refletem em enormes problemas para a saúde pública em todo o mundo.

O cenário é complexo, porém sinaliza para duas verdades evidentes: prevenção e detecção precoce são as maneiras mais eficazes de se evitar as mortes por câncer de pulmão. A prevenção tem nome, chama-se ‘não fumar’, e a detecção precoce com tomografia, com base em dados científicos bastante novos, parece ter a chance de reduzir as mortes por câncer de pulmão, embora a um custo significativo.

Rastreamento do Câncer de Pulmão

Rastrear, seguir o rastro, a pista, investigar, inquirir. O termo rastreamento, na medicina, significa submeter alguém a testes que possam detectar a presença de determinada doença em uma fase inicial, ou mesmo uma fase pré-maligna. Em câncer de pulmão, o rastreamento é realizado em experiências desde a década de 60, com o objetivo de identificar a enfermidade em pessoas assintomáticas, enquanto a doença ainda é curável.

O Coordenador de Cirurgia Torácica Minimamente Invasiva do Hospital Albert Einstein, Dr. Ricardo Sales dos Santos, explica que as primeiras tentativas de rastreamento da neoplasia não foram efetivas para diminuir a mortalidade pela doença, porque a maioria dos programas utilizou como método de análise a radiografia de tórax (Raios X), capaz de identificar com acuidade apenas as lesões em estágio avançado. "Também, o tumor pode estar em locais onde os RaiosX mostra ou, quando em tamanho muito pequeno, pode ser confundido com outros elementos como um vaso sanguíneo, por exemplo”.

National Lung Screening Trial – Dr. Ricardo afirma que a primeira experiência de rastreamento do câncer de pulmão que despertou atenção da comunidade científica foi o National Lung Screening Trial, dos Estados Unidos, que em andamento há alguns anos, já apresentou resultados animadores. O Programa envolveu 50 mil indivíduos entre 55-74 anos, que fumam mais de 30anos/maço (1 maço por dia por 30 anos) ou que pararam de fumar há menos de 15 anos, e dividiu-os em dois grupos. O primeiro grupo realizou radiografia simples de tórax e o segundo Tomografia Computadorizada de Baixa Dosagem (TCBD).

O estudo conseguiu mostrar que a TCBD é capaz de detectar o câncer de pulmão em estágio mais inicial, o que permitiria tratar mais precocemente e levar à redução da mortalidade. No grupo que realizou a radiografia simples de tórax, a mortalidade foi 20% maior do que no grupo da tomografia.

"O National Lung Screnning Trial conseguiu colocar uma pedra fundamental na percepção de que a tomografia reduz a mortalidade por câncer de pulmão”, declarou.

Ainda que seja hoje o método mais eficiente de rastreamento do câncer de pulmão, a TCBD ainda não é o ideal. No estudo, 95% dos exames que mostravam alguma alteração suspeita resultaram em falsos positivos (ou seja, as alterações não eram câncer), exigindo que o indivíduo retornasse após alguns meses para refazê-lo, e muitas vezes levando a biópsias que não indicavam o câncer.

Riscos e Benefícios - Sales dos Santos concorda que o rastreamento do câncer de pulmão apresenta riscos, mas ainda assim é a forma mais oportuna de reduzir as mortes decorrentes da neoplasia.

"O rastreamento do câncer de pulmão é caro e pode incorrer em riscos. Por isso, é imprescindível que programas de rastreamento sejam realizados em centros de excelência e compostos por equipes multidisciplinares de investigadores especializados em pulmão, como pneumologistas, cardiologistas, cirurgiões torácicos e infectologistas”.

Para além dos desafios, os benefícios. O rastreamento do câncer de pulmão está sempre aliado a um programa de cessação do tabagismo, ou seja, qualquer participante de um programa necessariamente será convidado, estimulado a parar de fumar. "Dessa forma, além de rastrear a neoplasia entre o grupo de risco, ainda previne-se casos possíveis de câncer de pulmão no futuro”, finaliza o médico.

Caso perceba que pode fazer parte de um grupo de risco ao câncer de pulmão, converse com seu médico sobre a existência de programas de rastreamento no Brasil e as formas de participar.
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