OncoDebate: tudo sobre BRCA
No dia 30 de outubro, reunimos especialistas para falar sobre BRCA em um evento on-line voltado para mulheres e pacientes com câncer de mama ou ovário portadoras da mutação de BRCA1 e BRCA2, profissionais da saúde e público geral interessado no assunto. A transmissão aconteceu ao vivo, pelo nosso canal no YouTube TV Oncoguia.
Confira os principais destaques.
Abertura
Evelin Scarelli, coordenadora de relacionamento institucional do Oncoguia
Evelin apresentou e falou sobre as nossas ações e iniciativas para pacientes com câncer e, em especial, para pacientes com mutação BRCA1 e BRCA2.
Ela também apresentou a página especial sobre BRCA aqui em nosso portal e o grupo fechado e exclusivo do Facebook para pacientes com mutação BRCA.
Sou mutada! E agora? Implicações na minha vida e na minha família
Maria Isabel Achatz, coordenadora da unidade de Oncogenética do Hospital Sírio-Libanês e médica geneticista pela Sociedade Brasileira de Genética Médica
Maria Isabel explicou desde o comecinho todo o processo de formação do indivíduo a partir da composição de DNA paterno e materno até a possibilidade de surgimento das mutações genéticas.
Segundo a médica geneticista, os genes BRCA1 e BRCA2 liberam proteínas supressoras de tumor. Em pessoas com a mutação, esses genes não funcionam direito e assim aumentam o risco de desenvolvimento de câncer. Mulheres com mutação no BRCA1, por exemplo, têm um risco aumentado de mais de 70% de desenvolver câncer de mama.
Ela destacou que descobrir a presença da mutação pode ser uma grande oportunidade, pois é possível se cuidar melhor e até mesmo cuidar de outras pessoas da família que podem ter a mesma mutação sem saber. Além disso, essa informação permite que as pessoas saibam como definir próximos passos junto com seus médicos.
Outro ponto de alerta destacado foi sobre o cuidado em relação ao câncer de ovário. Segundo Maria Isabel, o câncer de mama apresenta boas técnicas de rastreamento, mas o câncer de ovário não. Por isso, sabendo da presença da mutação, é possível se planejar e se cuidar de forma mais adequada.
Por fim, ela ressaltou que o trabalho do geneticista é colocar as informações na mesa, explicar as vantagens da descoberta da mutação e orientar os pacientes sobre os próximos passos.
Impacto da mutação na cirurgia do câncer de mama
Silvio Bromberg, mastologista e coordenador cirúrgico da Clínica Integrada de Mastologia do Centro de Oncologia do Hospital Albert Einstein
Silvio detalhou as possibilidades cirúrgicas para mulheres mutadas já com câncer de mama e para aquelas que descobriram a mutação, mas não têm câncer.
Para aquelas que descobriram a mutação BRCA, mas não têm câncer e querem saber o que fazer, o mastologista apresentou as seguintes orientações:
Em relação ao rastreamento, a mulher com mutação precisa de um acompanhamento mais intenso do que a população em geral. Segundo o médico, a recomendação no Brasil para a população em geral é de mamografia uma vez ao ano a partir dos 40 anos. Para mulheres com mutação BRCA, o indicado é a realização de exames clínicos a partir dos 20/25 anos e com exames de imagem dos 25 anos em diante. Os exames clínicos devem ser realizados a cada seis meses, mesmo que a mulher não apresente sinais e sintomas. Dos 25 aos 30 anos, também deve ser realizada ressonância com contraste um vez ao ano e a partir dos 30 anos, ressonância e mamografia anualmente.
Silvio ainda falou sobre outras questões como fertilidade, uso de pílula anticoncepcional, fertilização in vitro e reposição hormonal para estas mulheres.
Já em mulheres com câncer de mama e com a mutação BRCA 1 ou 2, Silvio destacou que o primeiro passo é tratar com foco no câncer, ou seja, na doença base, mas também olhando para a mutação.
Em casos de BRCA1, segundo ele o tratamento leva em consideração a idade do diagnóstico. Ele ainda destacou que não é obrigatório que a paciente retire a mama inteira, mas precisa estar ciente de que terá maior chance de ter um novo tumor na mesma mama e 3% a 4% de chance de ter tumor na outra mama. Ele ainda ressaltou que quem preserva a mama, tem que fazer controle rigoroso. Por isso é importante ponderar com a paciente seus desejos, sua idade e seus planos de vida.
Em mulheres com mutação BRCA2, o comportamento biológico da doença costuma ser mais parecido com o de mulheres sem a mutação. Por isso, o tratamento se baseia na agressividade do tumor e a presença da mutação ajuda na definição de agregar ou não alguma medicação específica e na decisão pelo tratamento cirúrgico (cirurgia conservadora ou radical).
Impacto da mutação na cirurgia do câncer de ovário
Renato Moretti Marques, coordenador do serviço de ginecologia oncológica do Hospital de Ensino Vila Santa Catarina da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein e do programa de pós-graduação em Cirurgia Robótica em Ginecologia do Hospital Albert Einstein
Renato apontou que o câncer de ovário é uma doença relativamente rara, com cerca de 6 mil casos por ano no Brasil. Apesar disso, a preocupação com a doença se dá por conta da dificuldade de diagnóstico precoce, já que não existem estratégias de rastreamento eficazes para este tipo de tumor. Assim, na maioria dos casos, os diagnósticos são avançados, com tumores maiores e com menores chances de tratamento curativo.
A presença da mutação no gene BRCA é um importante fator de risco para câncer de ovário e ter essa informação ajuda a definir algumas estratégias para prevenir o desenvolvimento de um câncer. Assim, o especialista reforça a importância de mulheres com histórico familiar e pessoal que levantam suspeita da presença da mutação realizarem o teste genético.
Dentre as possibilidades de redução de risco para mulheres mutadas, Renato destacou a possibilidade de quimioprevenção, isto é, uso de anticoncepcional oral com bloqueio de ovulações e redução de processo inflamatório, que apresentam bons resultados contra o aparecimento do câncer de ovário em pacientes com BRCA1 ou 2, e a realização de cirurgia preventiva, isto é, remoção dos ovários e das trompas.
Mulheres com a mutação também devem tomar cuidados cotidianos como a adoção de hábitos saudáveis, alimentação adequada, evitar a obesidade e uso de anticoncepcional oral.
Renato ainda aponta a possibilidade de vigilância ativa em mulheres com BRCA1 ou 2 que não desejam realizar a cirurgia de redução de risco. Segundo ele, essa vigilância com exames como ultrassonografia transvaginal e testes de sangue não apresentam muitos benefícios, mas podem ser adotados em alguns casos.
Impacto da mutação na vida de uma paciente com câncer
Rodrigo Guindalini, oncologista clínico e oncogeneticista da Oncologia D'or
Rodrigo destacou que nas decisões do oncologista clínico, o conhecimento da presença de mutação BRCA1 ou BRCA2 ajuda no planejamento de melhores estratégias terapêuticas para cada paciente.
Em casos de câncer de mama, Rodrigo destacou que quando a doença é localizada, as possibilidades são de cirurgia e outros três tratamentos - quimioterapia, radioterapia e hormonioterapia. A rádio e a hormonioterapia independendem de a mulher ter ou não mutação. O que muda com a mutação é a possibilidade de usar um medicamento quimioterápico a mais antes da cirurgia: a maioria das mulheres mutada tem câncer de mama triplo negativo e, normalmente, tumores grandes. Assim, a quimio antes da cirurgia ajuda a chegar na operação com tumor menor ou até eliminado.
Já em mulheres com câncer de mama avançados, Rodrigo destacou que existem grandes avanços e estratégias mais personalizadas no uso de quimioterapia, e tem ainda a terapia-alvo com inibidores de PARP, especialmente para mulheres com BRCA1 ou 2. De acordo com o especialista, inibidores de PARP possibilitam melhores respostas e maior tempo de duração da resposta do que em tratamentos convencionais.
Nos casos de câncer de ovário, que normalmente são diagnosticados mais tardiamente e com tumores avançados, Rodrigo ressalta a importância do acompanhamento multidisciplinar e da identificação da melhor terapia ser feita em conjunto entre oncologista e cirurgião ginecológico. De acordo com o médico, pacientes com câncer de ovário fazem, na maioria dos casos cirurgia e quimioterapia, ou quimioterapia, seguida de cirurgia e quimio novamente. Para pacientes com mutação BRCA 1 ou 2, existe agora a possibilidade de realizar a manutenção com inibidores de PARP. Essa possibilidade tem se revelado satisfatória evitando recorrência rápida da doença e poupando as mulheres de novas quimioterapias por um período de até três anos. Rodrigo ressaltou a importância dessa descoberta para o tratamento de câncer de ovário e apontou que todas mulheres com a doença deveriam ser testadas para BRCA.
Rodrigo ainda falou sobre outros dois tipos de câncer que também podem estar associados à mutação BRCA 1 ou 2.
Em homens, a presença da mutação no gene BRCA aumenta o risco de câncer de próstata e, em alguns casos, mas mais raramente, a mutação também aumenta o risco de câncer de pâncreas. Por isso, o especialista ressalta que homens também devem fazer o teste para mutação quando ela for identificada na família.
Qualidade de vida, câncer de mama e BRCA
Marina Sahade, oncologista no Hospital Sírio Libanês
Marina começou sua fala contando sobre sua história pessoal e familiar de câncer e as preocupações com a descoberta de uma possível mutação genética. A oncologista contou que a presença da mutação não se concretizou em sua família, mas ela ressaltou que sua história reforça a importância de falar-se sobre mutação genética e quebrar os mitos e preconceitos sobre o assunto.
Ela destacou que ninguém está preparado para a notícia de uma mutação, mas quanto mais as pessoas sabem que isso existe, mais fácil é de lidarem com o tema e quebrar os tabus.
Dentro de qualidade de vida, alguns temas que impactam a saúde emocional, segundo Marina, são o medo; medo de passar pros filhos, medo de não poder ter filhos; a culpa - nada disso é culpa sua!; falta de informação, assim como a dinâmica familiar. Marina ressalta a importância do suporte psicológico, da comunicação entre os familiares, e também a possibilidade de ter acesso a informações certas e de qualidade, se possível com o apoio de uma equipe multidisciplinar, com oncologista, oncogeneticista, mastologista, para que todos juntos possam esclarecer suas dúvidas, e te ajudar a entender e lidar com o que está acontecendo com você e com a sua família.
Por fim, a oncologista destacou ainda a importância da prática de atividades físicas como fator fundamental na qualidade de vida, na prevenção, na redução dos sintomas de tratamento oncológico, na diminuição do tumor, entre outros benefícios.
Depoimentos de pacientes e discussões finais
Ao final, Evelin Scarelli, relações institucionais do Oncoguia e ex-paciente de câncer de mama com a mutação BRCA2, se juntou à voluntária do Oncoguia, Anne Carrari, paciente com câncer de ovário metastático e com a mutação BRCA1 para compartilharem suas experiências e histórias de vida durante o processo de descoberta da mutação.
Ao final do evento, todos os convidados se uniram para tirar dúvidas dos participantes.