[PERFIL] Câncer de ovário: duas histórias, duas mulheres e sua fé na cura

Josilaine Bubach, 36, e Ana Cristina Taglione Boullon, 43. A primeira, capixaba residente em Vitória (ES) é ginecologista e obstetra; a segunda, paulista, mora em São Bernardo do Campo (SP) e é designer de vídeos.

Ambas, apesar das vozes afetuosas, ternas, falam com firmeza sobre a coragem para lutar contra o câncer que as acometeu. O câncer de ovário.

Para Josilaine, que se viu de repente diante da incumbência de deixar o lugar da médica para o ocupar o da paciente, a doença chegou sorrateira. Não emitiu sinal ou sintoma algum; a doença em Ana Cristina trouxe dores, inchaços abdominais, fluxo menstrual intenso e uma jornada de mais 6 meses com prescrições medicamentosas e intervenções clínicas equivocadas.  

Ambas estão ainda em tratamento para a doença em estágio avançado. A médica termina a última das sessões de quimioterapia do esperado último ciclo em alguns dias e, no final de maio, passará pela cirurgia. A designer foi já operada e passou da metade dos ciclos.

Parecem, as duas, estar em sintonia. Conectadas pelo desejo de curar-se, viver bem além do câncer.

Elas não temem ou maldizem a quimioterapia.

Ana Cristina agradece a cada sessão. "Agradeço por cada químio. Vou para a químio feliz e as enfermeiras dão risada! Agradeço pois existe um tratamento que me ajuda a ficar longe de celulazinhas de câncer que por ventura tenham ficado no organismo após a cirurgia. Não é para agradecer?!”.

Josilaine, como diz o ditado, ‘enxerga o copo meio cheio’, e não meio vazio.  Diz que a quimioterapia trouxe momentos difíceis, mas que esperava que seriam piores. "Eu senti que a cada sessão o tratamento ficava um pouquinho mais difícil, mas não era nada que não pudesse enfrentar. Então, isso quer dizer que foi bom!”.

As duas mulheres, que entre lenços e perucas buscam estar sempre com a autoestima em dia, têm outro afinamento: A fé!

Acreditam na ciência e na medicina como fontes de sua cura. Mas confiam, acima de tudo, em Seu Deus.

A designer e o difícil diagnóstico


Ana CristinaO diagnóstico do câncer de ovário para Ana Cristina veio, sem dúvidas, cheio de dor e questionamentos. Mas veio também como um grande alívio, já que por meses sofreu peregrinando por diferentes médicos com dores, perda vertiginosa de peso, apatia e angústia.

Tudo começou com o aumento do fluxo menstrual, em março do passado ano. Rapidamente vieram as dores na região pélvica e o inchaço repentino com a ingestão de um simples copo d´agua. Procurou por uma ginecologista, que diagnosticou – sem pedir exame algum – uma infecção urinária. Os 11 dias de antibiótico contribuíram para nada, a não ser para uma alergia medicamentosa.

A próxima profissional consultada foi uma gastro, que estranhando os sintomas pediu um ultrassom do abdome e um exame de lactose. Sem tardar Ana realizou os exames, mas como não conseguiu horário para o retorno se dirigiu a um segundo gastro, que diagnosticou uma intolerância a lactose.

Mais tempo passou e os sintomas permaneceram e levavam sua energia e vitalidade. Trinta quilos mais magra, Ana voltou à ginecologista, que solicitou um ultrassom transvaginal. A profissional diagnosticou um mioma e um cisto, e disse para Ana que "de tão pequenos não eram necessários nem mesmo medicamentos”.

"Foi então que minha vida literalmente parou. Como eu não tinha nada se sofria tanto? Minha mãe passou a me ajudar com tudo em casa. Eu mal podia me levantar”, lembra.

Ana voltou para à primeira gastroenterologista com a qual se consultou, que analisou todos os exames e solicitou outros. A profissional, atenciosa e preocupada com o quadro, diagnosticou uma trombose na perna e um possível tumor no ovário de Ana.

A internação em um centro de tratamento oncológico foi de urgência. "Somente aí é que pude compreender o que estava havendo comigo. Fiquei confusa e assustada, mas aliviada também. Soube que lá seria tratada de forma correta”, afirma.

Ana Cristina ficou 12 dias internada e, após as festas de fim de ano, realizou a cirurgia para a retirada de um tumor de 22 cm no ovário e diversos linfonodos.

"Antes de entrar na cirurgia eu estava mais que confiante. Disse ao meu médico que tirasse tudo de lá, pois eu não voltaria para aquela sala nunca mais! Ah, não voltaria mesmo!”.

E não voltou. O tumor foi totalmente retirado e deu-se início ao tratamento adjuvante pelo qual Ana passa hoje, com o apoio incondicional da família.

Para ver o tempo passar, Ana Cristina tornou-se cozinheira de mão cheia. "Eu tô que tô na cozinha! Minha especialidade são as sobremesas”, diz descontraída. Com a descoberta dos dotes na cozinha, quem tirou a sorte grande foram o marido e o filho de 15 anos.

A médica, a doença silenciosa e o recado aos colegas

JosilaineDra. Josilaine, que como hoje é paciente prefere ser chamada de Josilaine, sempre foi atenta à sua saúde e manteve-a ‘em dia’.

No último ano não foi diferente. Médicos consultados, exames realizados e resultados normais. Sem dores, inchaços ou alterações no fluxo menstrual. Nada. "Para não falar que nada, sempre tive pequenos desconfortos abdominais. Mas isso há anos”.

O diagnóstico aconteceu por acaso, quando a médica consultou-se com um ‘colega’, pois tinha a intenção de iniciar um tratamento para envelhecimento saudável. O médico pediu-lhe exames no mês de novembro, entre eles uma ultrassonografia que identificou uma massa tumoral pélvica.

Um recado aos colegas médicos

 A jovem médica e paciente iniciou neste dia 8 (Dia Mundial do Combate ao Câncer de Ovário) uma campanha junto aos colegas médicos ginecologistas. Alerta-los para que, mesmo contrariando artigos e estudos, peçam o ultrassom pélvico às suas jovens pacientes e, também, àquelas em idade avançada.

"Em todos os congressos ouvimos que este não é um exame para rastreamento, e que não melhora o prognóstico. Porém, devemos pensar que estamos falando de um câncer agressivo, que não tem sintomas e que, quando diagnosticado, pouco pode-se fazer (....) Vamos fazer nossa parte e solicitar esse exame, que em clínicas populares aqui de Vitória, custa cerca de R$60,00. E não deixemos nossas pacientes do SUS de fora deste contexto (...) quanto mais a gente pedir, mais os gestores verão a necessidade de disponibilizar o exame na rede”.

Imediatamente a ginecologista foi em busca da melhor alternativa de tratamento para a doença diagnosticada por casualidade. Viajou à São Paulo, consultou-se com especialistas daquela cidade e foi orientada a realizar o tratamento em Vitória.

"Foi tudo muito rápido. No mês de dezembro passei pela cirurgia que confirmou o câncer. Fizeram a laparotomia, mas não foi possível retirar o tumor, que era muito grande. Um carcinoma peritoneal, já havia atingido a bexiga e o intestino”, lembra.

Agindo com praticidade apesar do impacto da notícia, ela confiou nos colegas de profissão e tratou de partir para o próximo passo: a quimioterapia.

Hoje Josilaine não está clinicando, já que a área em que atua, da obstetrícia, exige total dedicação e disponibilidade às pacientes. Apesar da pausa no consultório, a jovem paciente diz que está vivendo a vida na maior normalidade possível.

Atividades físicas, dieta balanceada, lazer. "Só não posso ir à praia, para não manchar minha pele. Que saudades!”.

Mas ela está certa de que logo sua vida voltará ao normal. Em seu consultório – na cadeira da médica e não da paciente – junto das mães à espera de seus filhos, com suas corridas no calçadão e suas ‘baladas’ nos fins de semana...
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