Posicionamento: Nota do MS sobre compra centralizada de oncológicos
Nos últimos dias, tomamos conhecimento sobre uma Nota Técnica do Ministério da Saúde que analisa o atual modelo de disponibilização de medicamentos quimioterápicos no SUS com o principal objetivo de analisar se a compra centralizada de alguns tratamentos - como é feito atualmente para 6 deles - têm sido positiva ou não.
A Nota, que traz uma série de afirmações controversas e sem fundamentação, nos causou grande preocupação por deixar de lado várias evidências e dados que ajudam na leitura do que vem de fato acontecendo na atenção oncológica no SUS.
Três principais pontos nos causam grande preocupação e precisam ser analisadas com mais profundidade, levando em consideração evidências que já são de amplo conhecimento, para reconsideração pelo Ministério da Saúde.
1. As iniquidades geradas pelo atual sistema descentralizado da atenção oncológica: Na nota, a equipe do Ministério diz que “é equivocada a tese adotada por algumas organizações [...] de que a padronização, a aquisição e o fornecimento dos medicamentos antineoplásicos pelos hospitais resultam em iniquidades.”
É indiscutível a iniquidade gerada por padrões e protocolos diferentes entre os hospitais. São inúmeros os estudos e relatórios que exemplificam a grande iniquidade gerada pelo atual sistema. Como exemplo, citamos dois: estudo “Meu SUS é diferente do seu SUS”, do Instituto Oncoguia publicado na Brazilian Journal Of Oncology em 2017; e o Relatório final do Grupo de Trabalho sobre Acesso a Terapia Sistêmica do Câncer (GTATS) do Consinca, aprovado pelo INCA em 2021 e encaminhado ao Ministério da Saúde.
Esses documentos mostram como o tratamento sistêmico contra o câncer varia de maneira significativa entre os centros de tratamento do SUS. Em muitos centros se oferece tratamentos inferiores ao preconizado pelo MS, na maioria das vezes por insuficiência de recurso financeiro para aquisição do tratamento, que repetimos, muitas das vezes é preconizado, recomendado e incorporado pelo próprio Ministério da Saúde.
Somente o baixo conhecimento sobre o que é o tratamento sistêmico oncológico permitiria ignorar a iniquidade resultante desta disponibilização de tratamentos diferentes em instituições diferentes.
2. O questionamento do Ministério a respeito de esquemas terapêuticos diferentes, com medicamentos mais ou menos inovadores: Ao longo da Nota Técnica, são feitos alguns questionamentos e afirmações no sentido de que não existe, ou que frequentemente não é o caso, de esquemas quimioterápicos superiores a outros. Nesse mesmo sentido, também é questionado o posicionamento de vários gestores hospitalares, parlamentares, profissionais da saúde, organizações da sociedade civil, entre outros, de que muitos valores de reembolso de procedimentos quimioterápicos são insuficientes para arcar com medicamentos inovadores que, na maioria das vezes, são mais caros.
Mais uma vez, nos causa grande preocupação a argumentação que não é seguida da devida fundamentação ou justificativa com base em evidências e dados. Dado que se trata de um documento oficial do Ministério da Saúde que será - se é que já não está sendo - usado para nortear avaliações das políticas públicas da oncologia, acreditamos que é preciso reconsiderar esses pontos e fazer uma análise mais aprofundada.
3. A recomendação de revogar a aquisição centralizada de medicamentos oncológicos: A Nota recomenda que o MS não siga com a aquisição centralizada para 4 medicamentos oncológicos que hoje são disponibilizados por essa via. Essa recomendação também nos causa grande preocupação, dado que a compra centralizada vem sendo a opção mais assertiva para garantir acesso de forma equitativa aos pacientes do SUS.
É inevitável questionar quais os motivos para que a compra centralizada destes medicamentos não seja mais estratégica. De novo, a nota não traz argumentação suficiente que justifique essa mudança de posição do Ministério, optando por uma via que vai aumentar ainda mais as iniquidades no SUS.
Discordamos da decisão de descentralizar a compra dos medicamentos hoje ofertados pela via centralizada, e ainda, pedimos uma resposta efetiva do Ministério da Saúde para esses questionamentos. Enviamos no dia 30/09/2022 essas preocupações de forma detalhada para a Coordenação-Geral do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CGCEAF/DAF/SCTIE/MS), responsável por elaborar a nota, para que reavaliem o cenário com base nesses questionamentos que trazemos.
Não é possível avançar com a política oncológica e com o modelo de acesso ao cuidado oncológico com base em análises rasas e sem dar a devida importância a argumentos e evidências que já vem sendo sistematicamente comprovados pela sociedade nos últimos anos. Esperamos e cobraremos por uma revisão desta análise pelo Ministério da Saúde.
Acesse a íntegra da Nota Técnica nº 493/2022-CGCEAF/DAF/SCTIE/MS.
Acesse a íntegra do ofício enviado pelo Oncoguia.
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