Radar do câncer de pulmão no Brasil: desafios e prioridades
O Instituto Oncoguia lançou na última quinta-feira, 1º de agosto, na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, o Radar do Câncer de pulmão apresentando dados alarmantes sobre a realidade da doença no Brasil. Os dados são resultado da coleta e análise de 6.915 pacientes registrados no RHC (Registro Hospitalar de Câncer) do INCA (Instituto Nacional de Câncer) no ano de 2016.
Confira como foi o evento e os principais destaques dos debates realizados com especialistas no assunto.
Apresentação do Radar Câncer de Pulmão - Luciana Holtz, presidente do Instituto Oncoguia e André Marques, do cliqueSUS
Luciana e André apresentaram os principais resultados do Radar do Câncer de Pulmão no Brasil, uma fotografia de dados disponíveis no DATASUS, Globocan e INCA para dar ainda mais visibilidade para esse tema tão importante e urgente.
Segundo a Globocan, o câncer de pulmão é o que mais mata em todo o mundo. No Brasil, em 2016, o INCA estimava 28.220 novos casos da doença, mas apenas 6.915 fazem parte do Registro Hospitalar de Câncer, o que aponta para a existência de muitos casos subnotificados.
Entre os dados mais preocupantes, estão: 86,2% dos casos registrados tiveram o tratamento iniciado no Cacon em estadiamentos III e IV, isto significa que a chance deste pacientes de não sobreviverem em 5 anos varia de 60 a 100%. Também chama a atenção que apenas 51,6% dos registros possuíam a informação sobre tabagismo, sendo que 79,1% dos pacientes eram fumantes ou ex-fumantes e 20,9% nunca tiveram contato com tabaco. O desrespeito à lei dos 60 dias também foi demonstrado no radar: 29,83% dos casos tiveram a lei descumprida.
“Tivemos muitos avanços nas políticas de controle do tabagismo, mas ainda precisamos trabalhar em cima de alguns pontos, como por exemplo, conscientização sobre câncer de pulmão porque os números continuam crescendo, priorizar grupos de alto risco, melhorar acesso a exames e especialistas, criar estratégias para garantir acesso ao diagnóstico precoce, educar o paciente, garantir acesso a tratamentos mais efeitos focando em medicina personalizada e imunoterapia”, destacou Luciana Holtz.
André Marques destacou o objetivo deste levantamento. “Queremos trabalhar esses dados para mudar o curso da doença que temos hoje. Não é só o dado pelo dado, mas sim como utilizá-los da melhor forma.”
O Radar do Câncer de Pulmão irá monitorar os dados anuais de RHC (Registro Hospitalar de Câncer), de RCBP (Registro de Câncer de Base Populacional), SIM (Sistema de Informações de Mortalidade, Globocan e INCA. Além disso, também serão monitorados dados bimestrais do SIASUS (Sistema de Informação Ambulatorial) e do SIHSUS (Sistema de Informação Hospitalar).
Câncer de Pulmão: Desafios e Prioridades
Combate ao Tabagismo no Brasil - Sandra Silva Marques, Coordenadora Estadual do programa de tabagismo do Centro de Referência de Álcool, Tabaco e Outras Drogas (CRATOD)
“Muitas vezes o tabagismo não é entendido como dependência química, o que dificulta o manejo dessa pessoa na atenção primária. Tabagismo não é uma doença que se dá remédio e se cura, tem que fazer acompanhamento prolongado, existem recaídas, é considerado uma doença crônica e é a 1ª causa de morte evitável no mundo”, destacou Sandra. Ela apresentou as medidas do relatório MPOWER contra a epidemia do tabagismo e destacou que o Brasil é o segundo país de 192 a implementar a maioria destas medidas de combate ao tabagismo.
O desafio do acesso ao diagnóstico precoce e o papel do pneumologista - Irma de Godoy, Presidente Eleita (biênio 2021/2022) na Sociedade Brasileira de Pneumologia
“Precisamos mudar o quadro de diagnóstico tardio do câncer de pulmão. Já é difícil diagnosticar e quando diagnostica não recebe o tratamento adequado.” Foi assim que Irma começou sua palestra para abordar a importância do pneumologista no cenário do câncer de pulmão. “As pessoas esquecem que o pneumologista trata o câncer de pulmão. A equipe multiprofissional é extremamente importante: oncologista, cirurgião torácico, pneumologista, radioterapeuta, radiologista intervencionista, medicina nuclear, enfermeiro, fisioterapeuta, nutricionista, assistente social”, complementou a palestrante.
Segundo Irma, o pneumologista tem um papel primário, fundamental e importante na prevenção do câncer de pulmão e no diagnóstico precoce da doença, identificando pacientes para rastreamento, monitorando sintomas da doença de base e valorizando as mudanças de sintomas.
O programa de rastreamento do Hospital de Barretos: Resultados iniciais - Rodrigo Sampaio, Radiologista Torácico no Hospital de Amor (Hospital de Câncer de Barretos) - Unidade I
A cessação de tabagismo é a atividade com maior impacto na mortalidade por câncer de pulmão com potencial para melhora de saúde global. Uma indicação de que estamos no caminho certo é a redução na prevalência de tabagismo histórica. Mas para ir além, é preciso formular estratégias de detecção precoce do câncer em pacientes não tabagistas.
Hoje, o rastreamento com tomografia de baixa dose é a principal medida de rastreamento precoce em fumantes e ex-fumantes. Estudos comprovam os benefícios do exame com redução na mortalidade e aumento de custo-efetividade em todo o processo. Mas a desigual distribuição de tomógrafos no país é um dos desafios apontados por Rodrigo. “Somente 5% dos tomógrafos estão em municípios com menos de 50 mil habitantes.” Rodrigo apresentou dados de rastreamento realizados no Hospital de Amor e ainda falou sobre a carreta de tomografia móvel idealizada pelo hospital.
O papel multidisciplinar na detecção precoce do câncer de pulmão - Dr. Ricardo Sales Santos, Cirurgião Torácico no Hospital Albert Einstein em SP, e coordenador da medicina Respiratória do Hospital Cárdio Pulmonar na Bahia
Ricardo apontou que os principais desafios do câncer de pulmão no Brasil são a falta de programas contínuos de rastreamento, o baixo acesso à medicina especializada, os erros de diagnóstico e terapia, a falta de dados de qualidade e estruturados. Ele ainda ressaltou que o câncer de pulmão é silencioso, mas quando apresenta sintomas – como tosse, que é o mais comum - 85% dos casos - significa que a doença já está em fase avançada. Por isso é preciso criar estratégias para ir atrás dos pacientes ainda em fase assintomática. Por fim, ele ressaltou a importância da abordagem multidisciplinar para o tratamento destes pacientes, incluindo oncologista, patologista, radiologista, cirurgião e pneumologista.
Câncer de Pulmão no SUS: Desafios, Prioridades e Caminhos - Felipe Roitberg, Titular do Centro de Oncologia do Hospital Sírio Libanês- Grupo de Tumores Torácicos & Cabeça e Pescoço
Felipe Roitberg destacou que no SUS a maioria dos pacientes- entre 75% e 80% - chegam com diagnóstico tardio (localmente avançado ou metastático) quando a chance de cura é bem menor. Para eles, o que há de disponível hoje no SUS é quimioterapia. Mas, comparativamente aos tratamentos já existentes, a quimioterapia tem uma resposta inferior.
As terapias-alvo e a imunoterapia seriam as opções mais adequadas para estes pacientes, garantindo mais tempo e melhor qualidade de vida. No entanto, a incorporação dessas novidades terapêuticas pelo SUS passam por questões burocráticas e financeiras que acabam impedindo que muitos pacientes tenham acesso ao que há de melhor para seus tipos de câncer de pulmão.
Câncer de Pulmão na Saúde Suplementar: Desafios, Prioridades e Caminhos - Clarissa Mathias, Oncologista Clínica; NOB/Grupo Oncoclínicas; Presidente do GBOT e Membro do Conselho do IASLC
“Temos um problema seríssimo de subnotificação. O registro hospitalar não é obrigatório e tudo que se fala de câncer no brasil é deficitário para termos um retrato mais fidedigno.” Com base nisso, Clarissa aponta alguns desafios como os diagnósticos tardios, poucos pacientes tratados com intuito curativo e o grande número de pacientes não tratados.
A especialista apresentou ainda dados que mostram a desigualdade que existe no Brasil quando o assunto é acesso a exames diagnósticos. A quantidade de tomografias por milhão de habitantes no país é de 4,9 no setor público e 30,8 no privado. Quando o assunto é testes moleculares, menos de 50% são testados para mutação EGFR.
Clarissa ainda falou sobre a importância das pesquisas clínicas no Brasil para garantir acesso a melhores tratamentos por parte dos pacientes.
O papel do jornalista na causa do câncer do pulmão - Natalia Cuminale, Repórter na Veja
A repórter apresentou uma série de reportagens produzidas por ela mostrando o cenário do tabagismo no Brasil ao longo dos últimos e a evolução nos tratamentos da doença. Ela reforçou que a mídia tem o papel de informar a população dos riscos do tabagismo e dos avanços da medicina para o câncer.