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Belly Passos - Linfoma Não Hodgkin
Aos que estão na luta contra o câncer, eu peço que dêem muito amor aos seus entes queridos, pois é disso que eles mais necessitam.
Cheguei de viagem em Junho/2018, as 02:00 e quando minha mãe abriu a porta, eu notei que ela havia emagrecido muito - 6 quilos em três meses.
Vim passar férias na casa dela e comecei a notar que havia panos de prato queimados, colher de pau... a casa evidenciava que algo não estava bem. Minha mãe estava muito esquecida, calada... e faltando uma semana para as férias acabarem, comentei com meu esposo que ela não estava bem. Levei ela no médico e o primeiro diagnóstico era de Alzheimer. Fiquei arrasada! Levei ela pra casa e vi uma piora muito significativa, a ponto dela não conseguir mais comer sozinha. Levei ela para o pronto socorro e após a tomografia, recebi a notícia de que ela estava com metástases no cérebro, mas ainda não sabíamos onde estava o câncer primário.
Algo muda dentro de nós com a notícia do câncer, queremos dar tudo de nós, aproveitar cada momento com a pessoa que amamos.
Depois de muito chorar, a única coisa que eu queria era abraçar minha mãe e segurar a sua mão até o fim... E assim foi. Prometi a ela que ia cuidar dela até o fim, mesmo não sabendo que estava com câncer, ela me abraçou, chorou, e disse que sabia que podia contar comigo.
Ficou internada, tomando corticoide, anticonvulsivos, e depois de 34 dias internada, ela retirou essa metástase do cérebro para fazer biópsia. O resultado demorou 15 dias para ficar pronto. Nesse intervalo, ela teve embolia pulmonar, o que agravou seu quadro significativamente.
A biópsia acusou um linfoma, esperamos mais 40 dias o resultado do exame imunohistoquimico que acusou um linfoma não-hodgkin, altamente proliferativo, de alto grau, com foco primário no sistema nervoso central. Esse resultado foi recebido no dia 20/09/2018. A primeira consulta da minha mãe foi marcada para o dia 14/11/2018 - 4 dias depois da sua morte.
Depois da cirurgia, minha mãe foi pra casa e estava se recuperando bem, comia sozinha, estava aparentemente bem. Mas de um dia para o outro, seu quadro piorou muito: ela não conseguia mais levar o garfo na boca, não conseguia mais ficar em pé no banheiro para escovar os dentes, tive que carregá-la no colo para levá-la ao banheiro. Ela dormia no meu colo, tinha uma sudorese noturna que exalava muito mal cheiro. No dia 10/10/2018, acordei cedinho, carreguei ela até o banheiro, mas ela não conseguiu urinar. Fiz um mingau pra ela tomar no desjejum, mas na primeira colherada ela convulsionou. Levei ela pro hospital que iria começar o tratamento, mas como era um hospital particular com poucos leitos destinados ao SUS, eles me negaram atendimento. Voltei com ela pro pronto socorro. A tomografia acusou que depois de um mês que ela retirou a metástase para biópsia, apareceu uma nova metástase, quatro vezes maior que a primeira que foi retirada.
Minha mãe paralisou o lado direito, parou de urinar, defecar, não conseguia mais comer, passou a usar ainda nasoenterica, sonda de alívio, não conseguia sentar mais. O hospital hesitou em internar minha mãe, pois o mesmo não era um hospital oncológico. Me disseram que já tinham me dado o diagnóstico e que não podiam interná-la por conta de uma infecção urinária.
Coincidentemente quem me atendeu na triagem foi o médico que havia operado a minha mãe. Chorei copiosamente, implorei a ele que a internasse pois não tinha condições de cuidar dela em casa naquelas condições. Ele atendeu meu pedido. Internou ela na ala de neurocirurgia.
Foram 30 dias nessa segunda internação e a cada dia minha mãe piorava mais, até que um dia a equipe da clínica médica me disse que não havia mais chances de cura pra minha mãe - ela não aguentava quimioterapia, não podia operá-la novamente pois ela teve embolia pulmonar recentemente, e que existiam apenas três alternativas: cuidados paliativos, tentar quimioterapia sabendo que ela não iria aguentar ou levá-la para morrer em casa. Escolhi mantê-la no hospital sob cuidados paliativos. E em 13 dias ela parou de falar, apenas repetia o que ouvia, foi falando baixinho, baixinho... até que um dia parou de falar por completo. Parou de mover a perna esquerda, parou de mover a cabeça, os olhos... até que um dia, no início da madrugada, ela começou a expelir edema do pulmão. Haviam metástases no pulmão, o câncer havia alastrado rapidamente. Ela não abria mais os olhos, seus pulmões agonizavam, seus órgãos paralisaram e foram cinco dias de muito sofrimento até que na madrugada de sábado, dia 10/11/2018, num dia chuvoso, acordei às 03:00 e vi que minha mãe estava com muita febre. Sua saturação estava abaixando rapidamente e não tinha mais como aumentar o oxigênio. Seus batimentos cardíacos estavam altíssimos, mas baixaram rapidamente. Ela estava com sepse. Minha irmã estava comigo, liguei para o meu marido que rapidamente veio para o hospital, e vimos minha querida falecer calma, serena e tranquila, de mãos dadas comigo e com meu marido, as 05:00. Abracei seu corpo ainda quente e agradeci a ela por todo amor que ela me deu. Não consegui chorar... o sofrimento dela era tão grande que eu não consegui chorar naquele momento. Só consegui sentir a dor da perda quando a deixei dentro do necrotério.
Aos que estão na luta contra o câncer eu só peço que deem muito amor aos seus entes queridos, pois é disso que eles mais necessitam. Deem muito amor, tudo na vida pode esperar, eles não.
Não há depois, faça tudo por eles agora.
Desde o dia que descobri o diagnóstico eu larguei tudo para ficar com a minha mãe: perdi semestre na faculdade, deixei meus filhos com meu esposo, deixei minha casa em São Paulo. Hoje tenho tudo isso novamente, mas não tenho minha mãe mais. Amei ela muito, fiz suas vontades, dormia com ela no meu colo, levava ela nos lugares que ela queria ir, nos amamos muito... era um amor surreal!
O luto tem sido amargo. Saudade que surrupia a alma. Mas a sensação de ter feito a minha parte me ajuda a seguir em frente. Nunca mais serei a mesma, pois o câncer dilacera quem fica também.